domingo, 13 de janeiro de 2008

n. y., n. y.

agora pouco, um amigo me contou sua percepção sobre uma performance num restaurante, em que usava headphones com indicações de como agir e como se dava o contato com seu companheiro, meu amigo "fazia" uma prostituta e o outro, um filósofo.
o interessante é que cada participante não sabia o que seria dito, o que iria fazer.
com suas palavras:

tem uma hora que eu (puta) recebo instruções para fechar os olhos e deitar a cabeça sobre a mesa (o bar lotado em volta) e há um breve relaxamento, e enfim eu imaginando uma montanha estico a mão com a palma pra cima, de repente de ohos fechados, sinto umas gotas d'água caindo sobre a palma da minha mão: o outro tá recebendo informações complementares, mas totalmente diferentes

gostaria de saber mais, mas fico imaginando a necessidade por outras formas de relação que buscamos, e essa performance toca num ponto comum ao les ephemères, do theâtre du soleil

seria bonito buscar o sentido dessa necessidade, vendo-a na performance de meu amigo,mas a mera descrição via msn já me coloca diante de uma outra maneira de ouvir falar, e tb de representar essa necessidade.

...

uma maneira que exclui o drama?
ou que abre-o, para outras estruturas e tramas?

Um comentário:

Pablo disse...

essa necessidade de novas relações tem a ver muito com a situação de cada artista no contexto social do qual ele/a faz parte. sinto que no brasil a gente sente muito a necessidade de experimentar novas mídias (vídeo-dança), novos espaços (teatro em prisões, banheiros, hospitais), o "inusitado" tem um apelo imenso para nós, e muitas vezes aparece como tema em si. vejo isso como uma vontade bastante ensolarada, estridente, como o nosso barroco, e vejo aí também (por trás do estridente) uma esperança; no meio dessa histeria, uma fé. aqui em ny sinto uma busca mais melancólica, mais desesperançada, muito austera e discreta, por eventos muito pequenos, muito íntimos e (para alguns) insignificantes. no fundo, o que se busca aqui é a recriação da intimidade, uma intimidade oposta a que anda em pauta nos big brothers e na mídia em geral. os norte-americanos e europeus estão num estágio bastante avançado de desencanto ou mal-estar cultural, parece que as grandes narrativas estão realmente mortas aqui, não há fé, mas profunda frieza e objetividade em relação ao horror que sem dúvida será o futuro. essas performances são quase insignificantes, muito caladas, e busca-se a construção de uma dramaturgia realmente mínima, muitas vezes engajando os sentidos do corpo diretamente - como a dizer que o corpo precisa ser estimulado fisicamente para voltar a si, para sair do estágio letárgico que todo mundo por aqui vive. interpreto isso não só como saturação de uma idéia de vanguarda, mas como saturação da sociedade e dos valores em si. não sei, acho o teatro experimental brasileiro histriônico, enquanto o daqui (e essa performance do bar era inglesa) é o contrário, é muito discreto, até demais. tenho a tendência a interpretar essa diferença como sintoma, como índice de estágios diferentes de elaboração da sociedade do espetáculo. então essa coisa da necessidade das novas relações que vc menciona varia muito de sociedade pra sociedade, o modo como isso entra em pauta no cotidiano dos artistas e na mídia e o modo como isso se organiza nos experimentos artísticos propriamente ditos. mesmo entre fortaleza e são paulo já se percebe uma diferença né. sem julgar o que é bom e o que não é, mas vendo essas performances aqui em ny é isso que me tem ocorrido. as performances me fazem enxergar as sociedades que as organizam. bjs pablo